quinta-feira, 15 de janeiro de 2015

Morte e armas

O soldado só quer que a guerra acabe. Só quer voltar para casa, para a mulher , sua horta,  seus vizinhos.
O guerreiro, homem de guerras, quer a vitória, quer a força, quer o conflito, quer dominar, dormir na casa do inimigo, tomar seu lugar tomar sua vida.
Eu? Eu sou um suicida, depois de muitas guerras é o que sou.
Eu só quero morrer. Só quero uma morte que justifique tudo o que eu disse e não disse, o que fiz e não fiz.
Se me arrependo da vida, não quero me arrepender da morte. Uma morte sem volta, sem escape. Uma morte definitiva. Tão gloriosa e soberana, tão inquestionável, em sua atitude derradeira. Uma morte que arranque de mim toda as máscaras e exponha de uma vez, pelo menos uma única vez o verdadeiro eu.
Não quero morrer só, nem tentando salvar-me.
Quero apenas guardar os últimos rostos, as últimas vozes como pedrinhas brancas.
Não quero brigar com ela não quero sofrê-la, que apenas se apresente entre meus pares, me tome pela mão e eu siga....
Mas se eu estiver só.....Que ela sente ao meu lado e com paciência esperemos o último por do sol...
E eu partirei, sem saber se foi o mundo quem dormiu ou fui eu...

Os que morrem não têm nome.
Os que sobrevivem tem esperanças
Os que matam têm História.

O soldado é arrancado de seu lugar, para onde quer voltar...
O guerreiro quer ir cada vez mais longe, tomando, dominando
O suicida só quer ficar num lugar único, só seu, que não posso ser tirado

Que não precisa ser defendido.

Homens e Cores

Eu vejo abaixo de mim um vale cinza entre montanhas imensas e tenebrosas.
Eu vejo idosos se arrastando ali, eles não têm quem os ensine tecnologias que facilitariam suas vidas.
Vejo crianças tortas, esquecidas com joysticks na mão. Vejo-as sendo brincadas, sem imaginação, só reagindo.
Há jovens lá também, manipuláveis, tristes. Em sua divina individualidade são todos iguais e tristes. 
Vestem  igual, falam igual, amam igual. São monstros caricatos. São sobras. Tenho medo deles.
Ele me olha então. Ele me pede silencioso. Tenho medo dEle também. Não quero decepcioná-Lo, não quero dizer “não” ao imenso amor. Mas Ele pede diz que eu devo amá-los. Que eu devo descer a montanha, que eu devo ir a eles.  Não vão ouvir, não vão me compreender. Vão abusar de mim. Por favor, deixe-me aqui. Deixe-me ficar de longe. Não sou melhor, não sou pior. Só quero ficar aqui no alto da montanha. Não me mande para o vale. Não me mande para eles. Ele me olha grave. Não responde. Me olha com amor. Olha para eles com amor. Sinto um desespero enorme, vivo, um bicho enjaulado dentro de mim. Quando me dou conta estou descendo a montanha. Perdido, com frio, com medo. Não posso voltar. Quando voltar serei diferente. Nem mesmo vou me reconhecer. Mas Ele sorri por trás de mim. Não olho para trás. Sei que Ele me acena com um sim. Estou entre duas montanhas negras. Não posso  ficar, não quero ir.

Eu vi mulheres que sabem dançar muito bem. Sabem encantar serpentes. Sabem amar um homem como ninguém. Têm no corpo a deusa da luxuria. Há também as sábias com a idade e, as inteligentes e racionais, exatas como flechas. Firmes como martelos. Ah, tem também as que são como potes. Cabe de um tudo nelas. Você pode preenchê-las com o que quiser. E são negras, brancas, gordas, magras, bonitas, feias, singelas, sofisticadas, honestas e desonestas.
E tem você. Pequenininha, um pouco de cada uma delas outras. Mas você sabe sonhar. Você sonha sonhos como os meus. Você vê o que eu vejo. Sinto que tenho pátria. Que há solo  para minhas sementes. E que nem elas nem eu apodreceremos estéreis nesse deserto cintilante.
Você sabe sonhar. Meu deus, ela sabe sonhar. Ela tem visões. Ela ouve vozes. Ela sente os cheiros. Eu vejo os jardins secretos dentro dela. Eu vejo as montanhas de Deus. E nuvens, e ventos, e Luas, e sois. Eu vejo o mar.... Ela sonha. Meu Deus, ela sonha. Mas ela esta num outro tempo. Numa outra vida. Numa redoma de vidro que não posso quebrar.  A princesa e o plebeu.  A dama e o vagabundo. O vermelho e o negro. Talvez seja assim mesmo. Só uma lembrança. Só uma ilusão para eu não esquecer quem sou. Nesta floresta negra. Eu só sei semear, só sei cultivar orquídeas negras. Só sei falar de ciências e sonhos. Eu era um portador. Aprendia justiça, ciências e saber. Um dia eu ascenderia aos céus e acenderia as estrelas. Eu comandaria os ventos e evitaria sempre a cidade dos homens. Agora estou preso em celas de cimento e aço. Lá fora minha doce menina, sonha sonhos iguais aos meus.  Eu não posso abrir a porta. Mas já não há muito para ver aqui. Só Ele pode me fazer partir. Posso me fazer partir em desgraça.  Mas essa é uma oração que Ele não ouve quando faço. Quero começar o caminho de volta.