quarta-feira, 26 de novembro de 2014

Eclipse ( Conto - 07)



ECLIPSE  


Era o ano do Senhor de 1452. E ela num sobressalto se pôs de acordada e alerta. Era madrugada alta e a despeito de tudo o que seu quarto tinha de bonito e interessante foi para a janela que olhou primeiro. Lá fora estava o “monstro”.  Silenciosamente deslizou pela cama, pela porta do quarto e pé ante pé atirou-se porta a fora.
Seus tamanquinhos de madeira corriam velozes pelo campo, deixando atrás de si pegadas geladas.  Procurava não olhar para os lados, procurava não olhar para trás, mas principalmente não olhar para cima. Sua camisolinha branca e delicada, contrastava com aquela fria noite de inverno, misteriosa e cheia de magia.
 A visão do celeiro que se aproximava não aliviou a tormenta que  açoitava seu peito-menino. Só fez seus pés agora descalços e gelados deslizarem mais velozmente. O “horror” estava sobre ela, não havia tempo a perder. Abriu a porta num átimo procurando desesperadamente controlar a respiração e o martelar do coração que lhe alvoroçava a alma e o corpo.
 Respirou fundo e chamou baixinho. Silencio. Mais determinada chamou de novo. Foi quando o viu. De costas, sentado na janela mais alta do celeiro de pedras velhas e solenes. Envolto na fumaça de seu cachimbo. Subiu célere as escadas, procurando não fazer nenhum ruído. Velhas escadas rangentes.  De um pronto sentou rígida ao seu lado, rosto em chamas. Silenciosamente apontou para o horror.  A Lua que nascera coberta de sangue, agora era engolida pelas trevas profundas, eclipse. Sem tirar os olhos do fenômeno perguntou quase num sussurro o que era aquilo. Ele olhou para ela com o canto dos olhos e deu uma longa baforada com seu rústico cachimbo.  Respondeu com uma voz calma e tão baixa que parecia apenas um eco dos ventos lá fora, que ele também não sabia. Um longo e tribulado silencio se fez entre eles. Podia-se ouvir o coraçãozinho dela metralhando as têmporas pálidas da menina. Seus olhos se encheram de lágrimas quentes e mil demônios passaram por sua cabecinha. Sim, pensou ele. Ela devia ter ido ao mercado e ouvido estórias. Povo ignorante. Em um rompante, esquecendo toda a conveniência, abraçou-a. Ela manteve-se rígida, paralisada de susto e surpresa. Mas o calor do corpo dele, o cheiro que exalava, sua presença foram acalmando a menina, que se deixou aninha em seu ombro.
Ainda olhando-a pelo canto dos olhos e fitando o monstro no céu ele falou:
- As  vezes, menina, não sabemos o quê esta a nossa frente. Mas isso não importa. Importante é saber que não estamos sozinhos. E pousou suas mãos fortes nas pequeninas mãos dela. Ajeitou-a mais uma vez em seus ombros acolhedores. E ficaram ali diante do assombro. Quietos. Em prontidão solene, mas tranqüilos.
Algumas coisas são para sempre.
Amigos são para sempre.
E eu estarei lá com você.... sempre.

Rio 05/07/2009 ( 8:05h)
Walter paulino.

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