ECLIPSE
Era o ano do Senhor de 1452. E ela num sobressalto se pôs de acordada
e alerta. Era madrugada alta e a despeito de tudo o que seu quarto tinha de
bonito e interessante foi para a janela que olhou primeiro. Lá fora estava o
“monstro”. Silenciosamente deslizou pela
cama, pela porta do quarto e pé ante pé atirou-se porta a fora.
Seus tamanquinhos de madeira corriam velozes pelo campo, deixando
atrás de si pegadas geladas. Procurava
não olhar para os lados, procurava não olhar para trás, mas principalmente não
olhar para cima. Sua camisolinha branca e delicada, contrastava com aquela fria
noite de inverno, misteriosa e cheia de magia.
A visão do celeiro que se
aproximava não aliviou a tormenta que
açoitava seu peito-menino. Só fez seus pés agora descalços e gelados
deslizarem mais velozmente. O “horror” estava sobre ela, não havia tempo a
perder. Abriu a porta num átimo procurando desesperadamente controlar a
respiração e o martelar do coração que lhe alvoroçava a alma e o corpo.
Respirou fundo e chamou
baixinho. Silencio. Mais determinada chamou de novo. Foi quando o viu. De
costas, sentado na janela mais alta do celeiro de pedras velhas e solenes.
Envolto na fumaça de seu cachimbo. Subiu célere as escadas, procurando não
fazer nenhum ruído. Velhas escadas rangentes.
De um pronto sentou rígida ao seu lado, rosto em chamas. Silenciosamente
apontou para o horror. A Lua que nascera
coberta de sangue, agora era engolida pelas trevas profundas, eclipse. Sem
tirar os olhos do fenômeno perguntou quase num sussurro o que era aquilo. Ele
olhou para ela com o canto dos olhos e deu uma longa baforada com seu rústico
cachimbo. Respondeu com uma voz calma e
tão baixa que parecia apenas um eco dos ventos lá fora, que ele também não
sabia. Um longo e tribulado silencio se fez entre eles. Podia-se ouvir o
coraçãozinho dela metralhando as têmporas pálidas da menina. Seus olhos se
encheram de lágrimas quentes e mil demônios passaram por sua cabecinha. Sim,
pensou ele. Ela devia ter ido ao mercado e ouvido estórias. Povo ignorante. Em
um rompante, esquecendo toda a conveniência, abraçou-a. Ela manteve-se rígida,
paralisada de susto e surpresa. Mas o calor do corpo dele, o cheiro que
exalava, sua presença foram acalmando a menina, que se deixou aninha em seu
ombro.
Ainda olhando-a pelo canto dos olhos e fitando o monstro no céu ele
falou:
- As vezes, menina, não sabemos
o quê esta a nossa frente. Mas isso não importa. Importante é saber que não
estamos sozinhos. E pousou suas mãos fortes nas pequeninas mãos dela. Ajeitou-a
mais uma vez em seus ombros acolhedores. E ficaram ali diante do assombro.
Quietos. Em prontidão solene, mas tranqüilos.
Algumas coisas são para sempre.
Amigos são para sempre.
E eu estarei lá com você.... sempre.
Rio 05/07/2009 ( 8:05h)
Walter paulino.
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